SÃO PAULO - O futebol espanhol é dominado por dois gigantes, Real Madrid e Barcelona, mas eventualmente um terceiro time consegue sucesso em campo e chama atenção dos amantes do esporte - como o Atlético de Madri esta temporada, que vai disputando o título da La Liga desde as primeiras rodadas. No meio da década passada, esse time que chamou a atenção foi o Villarreal, de uma cidadezinha de 50.000 habitantes.
No auge da bolha imobiliária, esse time conseguiu nomes de peso, como Nilmar, Juan Román Riquelme e Juan Pablo Sorín. Alcançou as semi-finais da Champions League, o prestigioso campeonato interclubes da Europa em 2006 e só foi derrotado pelo Arsenal. E desde então foi rebaixado para a segunda divisão - embora tenha voltado e esteja em 7º na primeira divisão espanhola.
Sua história tem muito a ver com o crescimento do crédito e da bolha imobiliária na Espanha, que se deu depois da Lei do Solo em 1998 e da adesão ao Euro. De 2005 a 2011, o grande patrocinador do Villarreal foi o Aeroporto de Castelló - um aeroporto "inaugurado" em 2011 que nunca viu um mísero avião comercial pousar ou decolar desde então. Construído com o crédito fácil da década passada e com a corrida por construir no país - mas sem efetiva utilidade.
Com o "boom" do país anos atrás, prefeituras e governos autonômos correram para inaugurar aeroportos, cada um maior que o outro, em cidadezinhas, ou regiões. O Aeroporto de Castelló fica localizado na mesma província que Villarreal, em duas cidadezinhas: uma com 320 habitantes e outra com 1.000. No total, durante o auge da construção civil espanhola, foram construídos 48 aeroportos. Dos quais apenas 11 possuem algum tipo de lucro.
O auge
O auge da construção civil espanhola também permitiu o Villarreal renovar seu estádio, em 2006 - se endividando para tal. Situado em uma cidade de 50.000 pessoas, o estádio El Madrigal cabe cerca de 22.000 pessoas - pouco menos de metade da população da cidade. A região autônoma possui 500.000 habitantes e muitos deles saem de suas cidades para assistirem o El Submarino Amarillo, embora Barcelona e Real Madrid sejam os mais populares.
Chegou um momento na Espanha que o importante era ter construção para empregar todos: o desemprego estava na mínima histórica, a renda crescia e o crédito era abundante tanto para quem quisesse empregá-lo na ponta da oferta, quanto na demanda. Nesse cenário, o preço das casas disparou. O metro quadrado passou de € 1.000 para € 2.800 entre 1998 e 2006, o auge da bolha - alta de 180%. Nesse período, a inflação foi de 30,73%.
Como era cultural do espanhol comprar a casa própria, o país todo se endividou para ter o próprio imóvel - em financiamentos que chegavam até os 40 anos. Mesmo com juros mais baixos por conta do Euro, os bancos ganhavam bastante e o governo arrecadava tanto em tributos que chegava a gastar com o que não precisava, incluindo aí os aeroportos desnecessários e ajuda aos times de futebol locais, dos quais o Villarreal se beneficiou.
Até mesmo o consumo de eletrodomésticos, para equipar as novas casas, carros e outros objetos de consumo cresciam. Como investimento, muitos espanhóis passaram a comprar imóveis que não iam habitar - apenas para ganhar na valorização. Tudo ia bem na economia espanhola até o momento em que a bolha estourou.
Pluft
Se o Villarreal ia bem no campo, isso acabou quando o dinheiro fácil secou. Embora já tivesse estabelecido no futebol espanhol e disputando competições europeias, permitindo-o receber uma quantia maior em direitos de TV, as ajudas do governo local e do patrocinador acabaram. Desde então, o Villlarreal está sem um grande patrocinador que estampe seu nome na camisa - já passou por um parque de diversões e hoje está com uma empresa de cerâmica.
Com o acordo com a Aeroporto Castelló terminando em 2011, o time foi rebaixado em 2012 para a 2ª divisão espanhola e perdeu boa parte de suas estrelas: Borja Valero, Diego López, Giuseppe Rossi e Nilmar deixaram o clube. Outros, como Cani, foram leais, mesmo com os supostos atrasos de salário que a imprensa espanhola noticiava.
Em 2008, a bolha imobiliária dos EUA estourou e levou a espanhola junto. Mas os efeitos na Espanha foram ainda mais perversos: a quantidade de imóveis havia crescido em 30% e o número de empregados na construção civil despencou. Isso fez com que o desemprego, que estava nos patamares mais baixos da história, atingisse patamares extremamente altos. Justamente pelo fato da construção civil representar 13,3% de toda a massa trabalhadora espanhola. Hoje, o desemprego entre os jovens bate 50%.
Esse cenário levou uma mudança total. O PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol) perdeu as eleições para o Partido Conservador, de Mariano Rajoy, que tenta tirar o país do buraco. Os bancos tiveram prejuízos extraordinários e muitos tiveram que ser resgatados. A ressaca da gastança desenfreada deverá levar vários anos para ser curada. E o Villarreal hoje briga para ser um time mediano.
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