A conta era relativamente simples. Em 2016, com a Selic a 14,15% ao ano, um investidor conservador conseguiria facilmente uma rentabilidade líquida de 11,7% em 12 meses, já subtraindo taxas aplicáveis (custódia de 0,3% para o Tesouro Selic, por exemplo) e Imposto de Renda (entre 22,5% e 15% da rentabilidade, dependendo do período de aplicação). Esta rentabilidade geraria uma receita anual capaz de arcar com o aluguel e gerar sobras significativas.
Por exemplo: quem tivesse R$ 1 milhão no bolso naquela época lucraria, líquidos, R$ 117 mil ao ano investindo todo o montante em Tesouro Selic. Outros investimentos poderiam apresentar ganhos ainda maiores sem sair da renda fixa – alguns CDBs de menor liquidez rendem até 20% a mais no ano. No mesmo período, o imóvel de R$ 1 milhão tinha aluguel médio de R$ 44 mil ao ano, de acordo com estudos do FipeZap daquela época. Ou seja: investir em Tesouro Selic com o dinheiro da compra do imóvel poderia pagar o aluguel e garantir uma “sobra” de R$ 73 mil apenas no primeiro ano.
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Pior ainda para o proprietário, o período entre 2016 e 2017 representou queda nos preços de vendas em termos reais em mais da metade das capitais brasileiras mapeadas pelas pesquisas. A variação acumulada daquele ano ficou negativa em 0,57% – ou seja, o imóvel adquirido provavelmente desvalorizaria no mercado, reforçando ainda mais a vantagem financeira de morar de aluguel.
Mas há sinais de mudança neste início de 2018. De acordo com dados do FipeZap - Aluguel mais recente, referente a fevereiro, a média do “índice de rentabilidade” dos imóveis nas capitais brasileiras está novamente em 4,4% ao ano. Isso significa que, após oscilações, aquele imóvel de R$ 1 milhão é locado por uma média de R$ 44 mil anuais.
Para quem possui R$ 1 milhão agora, aplicando em ativos que rendem a Selic (6,5% a.a.), o rendimento anual líquido fica aproximadamente em 5,5%. Ou seja, em um ano, o dinheiro rende R$ 55 mil – valor que paga o aluguel e viabiliza “sobra” de R$ 11 mil no ano em questão. Vale lembrar que a conta muda de acordo com a rentabilidade do investimento alternativo e com o valor do aluguel.
Explicando em miúdos: caso o consumidor não compre o imóvel e pague a média do aluguel, de R$ 44 mil anuais, mantendo o dinheiro naquela aplicação, ele tem uma rentabilidade de R$ 11 mil acima destes gastos com o aluguel. O problema é que, neste caso, só é realmente vantajoso locar caso esse imóvel veja valorização menor que 1,1% no preço do aluguel ao longo deste ano (os R$ 11 mil, no caso do imóvel de R$ 1 milhão). Caso contrário, quem comprou fez um negócio melhor.
Observando novamente o histórico do FipeZap, todavia, percebe-se que a valorização do aluguel em algumas cidades, como São Paulo, Curitiba, Recife, Goiânia, Salvador e Florianópolis, superou esses 1,1% no acumulado do ano. Em São Paulo, por exemplo, o aumento já foi de 1,5%; em Florianópolis, chegou a 2,7%: mantendo a tendência, o preço do aluguel poderia passar de R$ 71 mil ao ano na capital catarinense – superando de longe a rentabilidade do investimento conservador atrelado à Selic.
Portanto, para que se mantenha uma vantagem do aluguel frente à compra na média das capitais brasileiras, é preciso torcer para haver uma mudança na tendência dos preços. Segundo especialistas, não é provável que essa tendência mude - principalmente em mercados mais aquecidos como a Grande São Paulo.
Na visão de Danilo Igliori, Chairman da DataZAP, do Grupo ZAP Viva Real, e professor da FEA-USP, os preços neste ano tendem a subir tanto para aluguel como para compra, considerando fatores como a melhora na economia, aumento no nível de emprego e, especificamente para a venda, queda nas taxas de juros do financiamento. “O que a gente sabe é que o cenário deve favorecer um aumento no preço de compra. Mas vemos um ritmo muito mais lento do que foi na década passada", diz, referenciando o boom nos preços visto ao redor de 2008.
Eduardo Zylberstajn, Coordenador de Pesquisas da Fipe, endossa esta visão. "O FipeZap mais recente ainda mostra um comportamento bem modesto, mas os valores pouco a pouco vão se recuperando e deve haver aumento real, acima do IPCA, para este ano” no macro, diz.
Isso significa que, para quem compra à vista, o ativo imobiliário também irá se valorizar caso haja a intenção de venda no médio e no longo prazo. “Vale a pena fazer a ressalva: a expectativa de valorização é relevante, mas o horizonte de tempo também”, diz Eduardo. “Se você compra e vende em um intervalo curto, há custos que você não consegue diluir, como cartório, corretagem, entre outros gastos marginais”, contabiliza.
Os especialistas também destacam as peculiaridades regionais. O Rio de Janeiro, por exemplo, deve demorar para ver a retomada nos preços, graças a fatores políticos, de segurança pública, industriais e de oferta. No primeiro trimestre, os preços dos imóveis acumularam queda real de 0,84%, puxada principalmente pelo Rio, BH e DF. "A Barra [da Tijuca, bairro no RJ] é um caso emblemático: houve uma expansão de oferta muito grande, que realmente não deve ser acompanhada pela demanda em breve", diz Danilo. "Tudo indica que a recuperação comece em São Paulo mesmo, na Região Metropolitana".
Queda na Selic e nos juros favorece o apetite pelo financiamento, o que também deve impactar nos preços dos imóveis. "Mesmo a pessoa que não tenha o recurso total, colocando na balança pode ser que faça sentido não deixar de pagar o aluguel e fazer o financiamento", diz Danilo. E esta balança não é apenas financeira. "Existe a questão da segurança: a pessoa pode querer ter a certeza de que poderá continuar morando naquele lugar. Enquanto é possível fazer modalidades de financiamento com juro fixo, o preço do aluguel pode variar bastante", analisa.
Frente ao pagamento à vista, porém, a verdade é uma só: embora os juros estejam em queda, o cenário em que a compra financiada era vantajosa no Brasil não existe mais e não parece estar perto de retornar.
Quando a Selic estava em patamares elevados, perto dos 14% ao ano, algumas modalidades de financiamento imobiliário eram ofertadas em torno dos 9% ao ano. Isso tornava interessante comprar financiado mesmo para quem possuía o dinheiro em mãos: bastava deixa-lo rendendo em ativos atrelados à Selic.
“Quem tinha trezentos, quinhentos, um milhão de reais, deixava o dinheiro rendendo e financiava o imóvel pagando juros mais baixos que a rentabilidade do ativo”, lembra o pesquisador. “Havia no Brasil um subsídio explícito à compra do imóvel financiado”, analisa. “Por isso que a gente tem um mercado de locação relativamente pequeno em relação a outros países. Nos últimos 10 ou 15 anos, valia a pena comprar financiado porque a taxa dos juros do financiamento estava abaixo do que você conseguia ao aplicar no mercado financeiro”.
Para este momento e o futuro próximo, ele acredita em uma reversão desta tendência. “Com a Selic rendendo 6,5%, juros longos também não muito mais do que isso, na casa dos 8%, e a Caixa financiando a 10% ao ano, não vale a pena financiar”, crava Zylberstajn.
Ainda que financeiramente a compra à vista pareça uma ótima opção, as movimentações geracionais levam a crer que o aluguel pode ser a tendência para os próximos anos. "Existem indícios de uma mudança comportamental das novas gerações: desapego a coisas materiais e valor maior a experiências. Nesse sentido, considerando a possibilidade de se movimentar mais ou ficar menos em casa, alternativas de aluguel são favorecidas. Não só o tradicional, mas opções diferentes, como serviços no condomínio e até residências coletivas", diz Danilo.
Ele alerta, porém, que o que existe são apenas especulações. "É uma frente forte tentar identificar essa tendência de forma mais clara, mas a magnitude desse comportamento e como ele vai crescer ao longo do tempo ainda são incertezas. Tanto por ser uma coisa nova como pelo fato de ter se iniciado em um momento de crise - quando as pessoas optam por aluguéis e espaços mais compactos também por questões financeiras", analisa.
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